A New England Journal of Medicine publicou recentemente um artigo que tem o potencial de ser o mais impactante de 2024 no campo da medicina. O estudo “BALANCE”, conduzido por pesquisadores da Austrália, Nova Zelândia e Canadá, avaliou o tempo ideal de antibioticoterapia em pacientes com infecção de corrente sanguínea. Aqui, analisamos os pontos-chave deste trabalho e como ele pode influenciar a conduta médica.
O Contexto do Estudo
Atualmente, muitos guidelines recomendam um tempo de antibioticoterapia de 14 dias para infecções de corrente sanguínea. Contudo, o estudo BALANCE propôs uma avaliação de não inferioridade entre os tempos de 7 e 14 dias de tratamento. A hipótese central é que uma duração mais curta poderia ser tão eficaz quanto o tratamento mais longo, sem comprometer a segurança do paciente.
Metodologia
O estudo foi conduzido entre outubro de 2014 e 2023, incluindo 3.631 pacientes randomizados em dois grupos: um recebeu 7 dias de antibioticoterapia, enquanto o outro foi tratado por 14 dias. Características principais do estudo:
- Critérios de inclusão: Pacientes com cultura positiva de infecção de corrente sanguínea provenientes de UTI, enfermaria ou pronto-socorro.
- Critérios de exclusão: Pacientes imunossuprimidos graves, endocardite, próteses ou outros focos que requerem tratamento prolongado.
- Desfecho primário: Mortalidade em 90 dias.
- Desfechos secundários: Mortalidade intra-hospitalar, tempo livre de antibóticos, tempo livre de suporte e complicações como infecções por germes multirresistentes.
Os pacientes incluídos apresentavam um perfil comum em ambientes hospitalares: idosos, frágeis e com alta mortalidade associada à infecção (cerca de 20%). O estudo foi multicêntrico, realizado em sete países, garantindo grande validade externa.
Resultados
Os resultados mostraram não haver diferença significativa entre os dois grupos em relação à mortalidade em 90 dias ou a outros desfechos clínicos. Isso confirma que 7 dias de antibioticoterapia são suficientes para tratar infecções de corrente sanguínea em pacientes não imunossuprimidos sem focos infecciosos complexos. Outros achados incluem:
- Complicações relacionadas ao uso prolongado de antibióticos: Não houve aumento de infecções por Clostridium difficile ou germes multirresistentes no grupo de 14 dias.
- Impacto nos custos: Embora o custo não tenha sido diretamente avaliado, é possível inferir uma redução significativa nos custos com internação e uso de recursos hospitalares.
Discussão
Este estudo segue uma tendência crescente na literatura médica: encurtar a duração da antibioticoterapia sem comprometer a segurança e a eficácia. Casos como infecções urinárias, pneumonia e abdômen agudo também têm mostrado que tempos mais curtos de tratamento podem ser eficazes.
Benefícios práticos:
- Redução de efeitos colaterais: Menor tempo de internação, menor risco de delírio e complicações relacionadas ao uso prolongado de antibióticos.
- Menor resistência bacteriana: O uso racional de antibióticos ajuda a conter a seleção de germes multirresistentes.
- Impacto positivo no paciente: Menos dias internado e retorno mais rápido ao convívio familiar e à rotina.
Críticas e Limitações
Uma limitação do estudo foi a ausência de uma análise de custo-benefício detalhada. Como o impacto financeiro é uma das principais vantagens da antibioticoterapia mais curta, futuros estudos poderão explorar melhor esse aspecto.
Conclusão
O estudo BALANCE destaca a necessidade de repensar as práticas atuais de antibioticoterapia, encorajando tempos mais curtos para infecções de corrente sanguínea. Este é um passo importante em direção a uma medicina mais racional, segura e baseada em evidências.
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